“Ensinar” a beber em casa

porFernanda Mograbi Jabbour

“Ensinar” a beber em casa

“Ensinar” a beber em casa ajuda o filho adolescente a beber com responsabilidade fora de casa? Verdade ou mito?

É mito. O que ocorre é exatamente o oposto. Pais que oferecem e que deixam seus filhos beberem álcool dentro de casa, mesmo que em quantidades limitadas, acabam estimulando-os ao consumo excessivo de álcool, ao padrão “binge drinking” (grandes quantidades em curtos períodos de tempo), a terem danos relacionados ao álcool e sintomas de Transtorno por Uso de Álcool (Abuso e Dependência).

Esta é a conclusão de um estudo inédito, realizado com 1927 adolescentes – dos 12 aos 18 anos – e seus pais, que analisou as consequências a longo prazo da oferta ocasional de álcool pelos pais.

Segundo Mattick, um dos autores do estudo, pais e médicos precisam ter consciência de que o fato da família oferecer álcool aos adolescentes está associado ao risco, e não à proteção. E, na minha opinião, muitas vezes a família não só oferece como incentiva o uso. A sociedade precisa se conscientizar de que álcool é uma droga e que, portanto, não deve ser usada pelos adolescentes.

Enquanto se é adolescente, a frase “beber com responsabilidade” ou então, “aprender a beber” não existem. ADOLESCENTE NÃO PODE BEBER. Seu cérebro está em formação e o córtex pré-frontal (área responsável pela censura, controle do impulso, planejamento, julgamento e tomada de decisão) só amadurece por volta dos 25 anos. Portanto, um cérebro que ainda está em formação é mais vulnerável aos efeitos danosos das drogas.

QUANTO MAIS PRECOCE É O USO DO ÁLCOOL MAIOR É A PROBABILIDADE DA CRIANÇA/ADOLESCENTE APRESENTAR PROBLEMAS COM ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS NO FUTURO.

Aqueles que começam antes dos 15 anos têm predisposição quatro vezes maior de desenvolver dependência em comparação aos que fizeram o primeiro uso com 20 ou mais anos.

Segundo a pesquisadora da UNIFESP, Zila Sanchez, é fundamental o retardamento da iniciação ao uso do álcool. Quanto mais tarde ocorre o início do uso menor é a chance de desenvolvimento da Dependência Química. Os pais têm um papel importantíssimo neste aspecto. Evidências científicas demonstram que quanto mais os pais mostram que não concordam com a ingestão de álcool pelos filhos menores de idade, quando não estimulam e mostram que não aprovam, menor a chance deste adolescente se envolver em padrões de risco de uso de álcool. Somente o fato de dizer aos filhos “eu não quero que você beba” já é uma forma de prevenção.

Concluindo: pais que permitem que os filhos bebam em casa com o intuito de protegê-los estão, na verdade, dando permissão para que as crianças bebam. Este comportamento dos pais estimula o consumo abusivo do álcool pelos filhos.

Portanto, em hipótese alguma, ofereça álcool a seu filho menor de idade. E, além de todos os motivos citados acima, no Brasil, apesar da não fiscalização, é crime ofertar álcool a criança ou adolescente. (Lei Nº 13.106, de 17 de março de 2015).

Estudo publicado no “The Lancet”. Realizado na Austrália, durante um período de seis anos, e publicado em 2018.

Association of parental supply of alcohol with adolescent drinking, alcohol-related harms, and alcohol use disorder symptoms: a prospective cohort study. Richard P Mattick, Philip J Clare, Alexandra Aiken, Monika Wadolowski, Delyse Hutchinson, Jackob Najman, Tim Slade, Raimondo Bruno, Nyanda McBride, Kypros Kypri, Laura Vogl, Louisa Degenhardt).

Sobre o Autor

Fernanda Mograbi Jabbour administrator

Psicóloga - PUC/SP – (CRP 06/57550) Especialização em Dependência Química – UNIFESP Psicóloga Clínica especialista no atendimento de pacientes com Transtorno por Uso de Substâncias Consultora Empresarial em Programas de Prevenção do Transtorno por Uso de Substâncias

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